segunda-feira, 23 de julho de 2012

Possível Utopia CAP. III


CAPÍTULO III
O sol já ia alto quando as duas moças sentaram-se nas confortáveis espreguiçadeiras a fim de bronzear suas peles.  Enquanto passavam protetor solar e protegiam-se com óculos escuros e chapéus, os homens se acomodavam à mesa servindo-se de cerveja e salgadinhos.  Comentavam sobre a abertura política controlada, a possibilidade de futuras eleições diretas.  O país vivia crises sociais, econômicas e agora políticas também. A realidade social constituía-se como fértil campo para as idéias transformadoras de Átila, como observava Martins.
Pedro Cláudio era o que falava menos. Pouco prosador, examinava muito e parecia estar sempre refletindo e analisando tudo.  Átila notou sua calma contemplação, sua meditação e seu silêncio concentrado.  Julgou interessante conhecer seus pensamentos: - E você, Pedro, o que faz na vida?  Qual é o seu ramo?  - Eu também sou escritor e edito livros junto com o Fred e o Martins. À noite dou umas aulinhas de sociologia, mas os temas que escolho para meus livros são o suspense e o policial. – E que tal a receptividade, vende bem? -Não me queixo, pois já houve tempos piores...  Fez uma pequena pausa, como a recordar-se de seus tempos mais negros.  Átila continuou: - Você é casado, Pedro? Tem filhos?... Vejo que não usa aliança, mas algo me diz que é ou já foi casado...  – Realmente, já fui casado e tenho três filhos pequenos.  Atualmente sou viúvo e sinto-me bem solteiro. Não penso em casar de novo, se é que vai perguntar... - Não, não ia perguntar, mas gostaria de saber qual juízo faz das minhas idéias.  Concorda, discorda, o que acha? – É para ser franco mesmo?... – Claro! Sem receios ou melindres. – Acho tudo muito bonito, perfeito, ideal, mas também muito ilusório.  Só mesmo como ficção.  Não creio ser possível concretizar tais utopias... – Então, você é a pessoa indicada para discutir comigo as suas razões. Muito posso aperfeiçoar meu livro com sua ajuda. – Mas nego, eu não concordo muito com tudo o que prega!... Como vou ajudá-lo? – Por isso mesmo!  Por não concordar é que poderá apontar fatos que serão importantes para uma correção de rumos. Com tais fatos poderei verificar se realmente tenho soluções possíveis para eles, pois você é um sociólogo e compreende como ninguém as interações e a rede social.  Pedro refletiu por pouco tempo e respondeu com mais convicção:  - Bem lá no fundo, eu também imagino que uma loucura dessa até que poderia ser tentada e vir a dar certo, desde que algumas variáveis pudessem ser controladas e garantidas... – Eh!... Assim você vai complicar tudo, pois eu não entendo dessa sociologia, onde tudo pode ser, num determinado contexto e deixar de ser, em outro contexto. - Você irá precisar de toda uma equipe técnica, composta de economistas, engenheiros, professores, sociólogos, psiquiatras, filósofos, médicos e estrategistas de toda sorte e ainda assim muitos erros seriam cometidos de início. – Não muito mais do que se observa na selva de pedra onde vivemos, concorda?  Depois, temos um vasto campo de referência capaz de orientar e desenvolver nossos projetos. Um bom começo seria levantar todas as alternativas negativas conhecidas na realidade capitalista a fim de evitá-las no futuro... – Cara, então você pensa mesmo numa sociedade melhor? Não se trata apenas de uma ficção, de um simples argumento para um livro?... Você quer mesmo fundar uma nova sociedade!... – A verdade é que não me conformo com o atual estado das coisas. Não quero fundar nada, apenas mostrar possíveis caminhos alternativos para alguns.  Confiar na capacidade de quem deseja realmente transformar para melhor e acreditar que cada um tem seu poder de decisão e de aceitação do que é melhor para si e para os outros. Quem sabe uma nova visão, uma nova compreensão de um futuro seguro não venha a transformar as pessoas e com elas a sociedade futura, pois esta já está com os dias contados do jeito que vai... Pedro conservou-se a observar Átila por algum tempo.  Era como se o examinasse mentalmente, mas sua análise deve ter sido positiva ou pelo menos satisfatória, pois logo sorriu e disse: - Realmente não sei ainda se você é uma espécie de idealista ou um grande sonhador, um visionário, mas fique sabendo que gostei de suas idéias e de você também. Mudando de assunto, perguntou se Átila não ia nadar um pouco com as meninas. Este avisou que voltaria para continuarem a conversa e pulou na água dando algumas braçadas até chegar onde estavam as moças.  Mergulhou e logo emergiu junto a Denise que já estava com os olhos vermelhos e brilhantes por causa do cloro na água. Abraçando-a pela cintura, deu-lhe um beijo, perguntando: - E então, gostando muito? – Oh!  Estou adorando isto aqui. Só que fiquei de pilequinho. Creio que bebi um pouco mais do que devia... Tudo está virando, virando... Até você está girando.  – Então já é hora de sair um pouco da água.  Vamos sentar um pouco com o pessoal.  E lá se foram os dois abraçados em direção ao grupo.  Sentaram-se e voltaram a falar sobre os projetos do livro e a ouvir as “sacadas” de Pedro Cláudio sobre as estruturas sociais da nova sociedade.   E Denise?  Como era aquela Denise de quem Átila tanto gostava?  Segunda filha de descendentes de pais italianos, foi uma menina que desde cedo mostrou inclinação pelas artes, a dança, a música e o canto.  Queria ser uma bailarina clássica, mas os pais não tinham muito tempo nem valorizavam as artes.  O importante era cursar uma boa faculdade e garantir uma boa profissão.  Dança era uma coisa para depois de formada.  Seu pai, gerente de uma pequena agência bancária, voltava sua vida quase que inteiramente para seu ofício. Sua mãe, bem mais jovem e bonita do que seu pai, iludia-se com admiradores, alimentando sonhos de grande popularidade e sucesso com os homens.  Gostava de escrever poesias e mantinha um diário pessoal que era o seu verdadeiro tesouro.  Orgulhava-se das inscrições deixadas ali pelos seus admiradores mais íntimos, pois fora muito bela quando mocinha e guardava desde cedo aquelas lembranças da juventude.  O marido, pai de Denise, dera para sair muito com amigos aos fins de semana, desde que Denise completara os doze anos.  A partir daí, as brigas entre o casal tornaram-se freqüentes e muitas vezes violentas, pois o gênio italiano de D. Gláucia sempre fervia quando seu marido aparecia bêbado e em plena madrugada.  D. Gláucia partia para cima dele com o que estivesse nas mãos e ele se defendia como podia. As acusações de parte a parte só agravavam mais a situação, a ponto da vizinhança intervir, retirando Denise e seu irmão da casa e, muitas vezes, chamando a polícia para atender a ocorrência.  Havia ocasião em que o senhor Mário, pai de Denise, também perdia a calma e agredia a esposa com violência.  Certa feita, deu-lhe um soco na face que a levou ao hospital, onde recebeu alguns pontos para fechar a ferida provocada pelo golpe.  Algum tempo depois disso D. Gláucia também começou a beber, pois acabou descobrindo que seu marido tinha “um caso” com uma funcionária do banco que era também casada.  Para ajudar sua mãe, o filho de D. Gláucia e irmão de Denise, resolveu interferir e acabar com, segundo ele, aquela traição.  Nessa ocasião Denise já completara seus 17 anos e seu irmão não ouvia ninguém e achava ser sua obrigação obrigar o pai a terminar com aquele caso, já que descobrira que a tal amante tinha também outro caso, além do que mantinha com o senhor Mário.  O resultado disso tudo é que pai e filho se desentenderam seriamente, pois o pai não acreditou no que lhe contou o filho, brigando muito, até que o rapaz informou ao marido da funcionária, amante de seu pai, que ela o traía. Com medo do rumo que as coisas tomavam, a funcionária do banco transferiu-se com seu marido para outra cidade e com isso os ânimos se acalmaram.  Porém a dura realidade tinha deixado marcas profundas e irremediáveis naquela família. Sem rumo e completamente desestruturadas, mãe e filha vagavam perdidas e desorientadas, sem qualquer controle.  D. Gláucia bebia continuamente, enquanto Denise procurava fora de casa os meios de fugir daquela amarga situação. Seu pai já não ligava mais para a família e o irmão vivia internando a mãe para tratamento ou levando-a a associações de alcoólatras, sem muito resultado duradouro.  Denise então passou a comandar a casa em lugar da mãe, cuidando do pai doente e do irmão, assim como da mãe alcoólatra. Mas ela não condenava tanto o pai quanto o resto da família.  Amargurava-se ao vê-lo sempre abatido, desmoralizado e humilhado, sem esboçar qualquer tentativa de reação, completamente entregue ao seu destino incerto...  Certa vez perguntara o que ele pretendia fazer com respeito ao futuro e sofreu muito ao ouvi-lo dizer que nesta vida, já estava fazendo hora extra! Dali para diante, cada um era responsável por sua própria vida e ele não tinha mais nada com aquela família.  Denise, nessa época, participava de um grupo de canto coral de uma faculdade, onde também fazia teatro com alguns membros do grupo coral.  Continuava a estudar à tarde, procurando esquecer os problemas domésticos. Tinha um namorado que cursava arquitetura e conhecera no grupo coral. Estava terminando já o segundo grau quando seu pai suicidou-se em casa.  Certa noite, ao voltar do coral, encontrou a casa aberta e abandonada. Uma carta de seu irmão sobre a mesinha da sala dava conta de que havia levado sua mãe ao hospital para tomar soro na veia desde cedo.  Ao dirigir-se ao banheiro descobriu ali o seu pai, estendido no chão, já morto, com uma bala na cabeça e a arma ainda na mão. Mais tarde ficou sabendo que seu pai já vinha pensando em dar cabo da vida desde algum tempo, pois cuidou para que a família não ficasse totalmente desamparada.
A mãe de Denise, com o tempo, aposentara-se prematuramente como funcionária pública e o irmão mais velho ingressara na carreira militar. Um tio, irmão mais velho de sua mãe, passou a morar com Denise e sua mãe, já que o irmão fora para a academia militar.  É nesse clima, já com quase 18 anos, que Denise vai conhecer Átila.  Seu tio deixou para os sobrinhos o apartamento onde morava, ficando o carro do pai para o irmão militar. Denise tivera de repetir o último ano do curso colegial e desejava também iniciar um cursinho pré-universitário, mas adiara esses objetivos ao conhecer Átila, com quem passou a viver no apartamento do tio.  Houve sério desentendimento entre Denise e seu irmão por causa dessa ligação sem casamento.  Júlio, o irmão dela, já conhecia a fama de Átila através da mídia e até gostava de suas idéias, mas quando se tratava de atrapalhar os estudos da irmã sua simpatia por ele mudava rápido.  Com o tempo percebeu que Átila, embora desaconselhasse a interrupção de estudos, não tinha lá grande influência nas decisões de Denise, como também não tinha o irmão.  Átila até se sentia meio culpado, mas quando viu que nada mudaria a idéia dela, conformou-se, assim como o irmão.  Ninguém poderia obrigá-la a nada.  Já tinha a maioridade e ponto final!...  A adversidade vivida na família endureceu muito a personalidade de Denise.  Ela não se importava muito com aparências e opiniões públicas e só fazia o que lhe convinha fazer.  Azar de quem não gostasse, pois já estava acostumada aos reveses da vida.  Apesar disso, Átila era a única pessoa que podia influenciá-la, como logo percebeu Júlio.  Como este só queria o seu bem, pois gostava mesmo dela, modificou o pensamento de Júlio e do tio, que passaram a aceitar a relação do casal.  Muito sensível a tudo, Denise agora queria curtir a vida em toda sua plenitude.  Tudo agora lhe parecia mágico e estimulante!  E Átila lhe proporcionava todas as emoções que podia e ela desejava.  Já conhecera outros homens, mas nenhum se aproximara tanto do que desejava e sentia-se inteiramente livre e independente ao lado de Átila. No momento não pensava em mudar nada e muito menos em filhos.  Isso era coisa para o futuro, quando os dois se conhecessem melhor e tivessem aproveitado bem o presente.  Mas isso era só idéia dela, pois Átila considerava filhos como uma conseqüência natural de uma vida conjugal.  Já possuía um casal de filhos, a quem dava todo carinho e atenção, pois o relacionamento dele com a ex-mulher e os filhos era o mais saudável possível. À sua maneira, sempre se respeitaram e as crianças sentiam isso.  Os filhos de Átila adoravam Denise e vice-versa e ela achava que a vida era repleta de ilusões.  A gente precisa de ilusões como precisamos de água, pensava.  Todos os objetivos, na verdade, são ilusórios mas não vivemos sem eles. Todos os sonhos, os ideais... Ilusões necessárias! “Saber lidar com os dados da realidade é uma dádiva, mas sonhar também é muito bom. Saber equilibrar ambos é a pura sabedoria e a gente “ser” é o mais importante!”   Aprender coisas novas, adquirir experiência, buscar objetivos, desfrutar ilusões e crescer: eis a meta do homem! Duvidar de tudo e conhecer pela própria experiência: isso é sabedoria!   Era assim a nossa Denise!  Uma jovem inquieta, muitas vezes inconstante porque intuitiva e inteligente.  Uma pessoa bela, otimista e alegre, com altos e baixos, que buscava seus horizontes e entregava-se de corpo e alma, razão pela qual algumas vezes sofrera na vida.  Mas sofrer também é bom!  Depois da tempestade sempre vem a bonança.  Ela mantinha certa ambição de fama e poder que procurava não evidenciar na presença de Átila.    Sabia a pouca importância que ele atribuía a essas ilusões.  Pensava mesmo que talvez fosse este o único defeito dele, pois pensava que, com o seu talento e carisma, já poderiam estar ricos e vivendo como nababos.  Se ele soubesse explorar suas qualidades!... Quantas ofertas lucrativas já o vira recusar que lhe trariam dinheiro e fama.  Mas ele era “ético!”. Preocupado com “o outro!”.   Jamais ficaria rico a qualquer preço.  Apesar disso o admirava demais. Sem ele as ilusões não teriam nenhuma importância, pensava.  Sabia que a admiração que se tem pelo parceiro é a força que sustenta o amor.  Enquanto se admira alguém, pode-se facilmente amar, mas isso logo desaparece quando se deixa de admirar.  E o que leva as pessoas a se  admirarem são justamente as ilusões... Aquelas coisas que imaginamos descobrir no outro, que julgamos nos faltar, razão pela qual as admiramos... Mas voltemos à piscina, onde Pedro Cláudio estruturava, junto com Átila, os fundamentos da nova sociedade de seu livro. Pedro solicitou cigarros, lápis e papel com a garçonete, ´pois queria anotar certas observações a fim de não esquecer.  Ao chegar o material pedido disse: - Começaremos por escolher um bom nome para o lugar, sua localização, descrição geográfica, clima, recursos, etc. Que nome daria à cidade?... Quem sabe “Paraíso Futuro”, ou “Sétima Morada”, que acha?  - Não! Ainda não chegamos lá.  Deixe ver com a ajuda da Denise.  Virou-se na cadeira e chamou a companheira: - Dê, nós estamos pensando num nome para a minha fu44tura cidade do livro. Como a chamaria você? Ao que ela respondeu: - Atilópolis, claro!  Que outro nome para sua cidade?  - Não é isso! Será um nome que inspire tranqüilidade, paz e segurança... Poderia chamar-se Fortaleza. Taí um bom nome! – Que é isso, rapaz?... Fortaleza já existe. É a capital do Ceará.  Atalhou Pedro.  Ao que decidiu Átila: - Então vai ser Sétima Morada mesmo! Ao que ajuntou Denise: - É isso aí, gostei!  Sugere uma espécie de refúgio para esse mundo cão.  Assim escolhido o nome foram se aprofundando e discutindo outros detalhes como relevo, população, recursos econômicos, humanos e materiais, atividades extrativistas e empresariais, etc. Estavam agora discutindo a espécie de “pioneiros” a desenvolver a região, pois os nativos existentes não teriam os conhecimentos e habilidades necessárias ao grau de desenvolvimento que se queria imprimir ao local. Não pode ser gente rude do lugar, apenas.  Temos de contar com gente preparada, esclarecida e capaz, verdadeiros líderes trabalhistas, sei lá! Argumentou Denise, continuando: - Como partir assim do quase nada, numa região natural, quase sem aculturação?... Respondeu Átila: - Imaginem uma grande região litorânea, quase virgem e praticamente desocupada de homens e sua cultura. As grandes indústrias não investiriam numa região assim, sem perspectivas futuras de lucros.  Mas um conselho comunitário local, reunindo recursos  oriundos de atividades próprias, aliados a acordos com instituições estrangeiras que para cá mandariam seus técnicos, máquinas, materiais e equipamentos, poderia em tempo acelerado criar as primeiras condições de ocupação e aculturação da região.  Foi quando Pedro Cláudio desejou saber: - Mas quem pagaria esses serviços, essa mão de obra especializada, a hospedagem, alimentação e manutenção dessas equipes? Ao que Átila concluiu: - Sei que existem instituições mundiais secretas que apoiam empreendimentos deste tipo, baseadas em suas filosofias de vida e perspectivas de salvação das populações carentes. Eles operam nos cinco continentes e estou certo de que se encarregariam de lançar as bases e infra-estrutura, as primeiras construções, estradas, portos, e aeroportos, garantindo com o Conselho Comunitário a manutenção inicial das equipes pioneiras. A construção de uma cidade planejada no meio de boa vegetação, hidrografia, bom relevo, clima e muito trabalho, logo haveria de produzir seus bons frutos, administrados, cultivados e desenvolvidos pelos primeiros habitantes admitidos pela escola preparatória local.   Já posso até imaginar grandes navios aportando em nossos rios e mares com equipamentos e máquinas, tratores, caminhões e materiais de construção, ferro, cimento, pedra, areia, assim como trabalhadores braçais e técnicos se movimentando na implantação de depósitos e casas de moradia desse pessoal.  Túneis subterrâneos para os trens que ligarão os quatro cantos da grande cidade de Sétima Morada, viadutos e grandes estradas de rodagem ligando as várias zonas urbanas com o meio rural.  Hospitais, escolas, bairros residenciais, comerciais e áreas de serviço público, pontes e praças, jardins e museus, bibliotecas e todos os recursos modernos surgindo com o passar do tempo.  Pedro Cláudio levantou a seguinte questão: - Vamos supor que a fase de implantação da infra-estrutura da cidade já se concluiu e que os habitantes já exerçam suas atividades e já vivam em comunidade sob a administração geral do Conselho. Com a boa vida garantida a todos, necessidades asseguradas e a segurança geral, quem garante que alguns não queiram deixar o trabalho pesado para se dedicarem à música, às artes, à criação de aves ou à poesia?... Ao que Átila respondeu: - Não é bem assim a coisa!... Não basta querer, para fazer o que se quer. Se houver aptidão, espiritualidade, talento e dedicação, ainda assim se precisará submeter o desejo de mudança ao Conselho.  A deliberação deste é que vai autorizar a mudança.  Que mal poderia haver em alguns desejarem essas atividades?  Sabemos que nem todos têm as mesmas aptidões e habilidades, não é?  O Conselho será soberano para julgar.  De que adianta eu querer ser um escritor e ninguém se interessar pelos meus livros, ou ser um pintor e ninguém quiser meus quadros?... Todos serão humildes para aceitar suas qualidades e habilitações de acordo com o senso comum e isto vale para qualquer profissão.  Se ninguém me procurar como médico, por exemplo, eu deverei procurar outra maneira de ser útil.  Então questionou Denise: - Como seriam as pessoas, digamos,  eleitas para esse conselho comunitário? – Pessoas sábias e experientes, de reconhecidas virtudes morais e exemplo cristão, indicadas pelos cidadãos representantes dos bairros e eleitas pela comunidade.  Continuou Pedro Cláudio: - Vamos supor que os adultos aceitem essa realidade.  E os jovens rebeldes e aventureiros, ainda cheios de ambições e más intenções? – Nunca seriam indicados ou eleitos!  Inconformados, poderiam voltar ao capitalismo original, onde poderão exercitar essas ambições e tendências negativas... Sempre se soube que o homem é produto do meio.    Se os melhores, os mais evoluídos dão todos os exemplos na formação das crianças e dos jovens será difícil não acreditar que as gerações futuras não se aprimorem cada vez mais.    As escolas de todos os níveis mostrarão aos seus alunos as guerras, a miséria, a exploração, o ódio e a fome que existem nos países do mundo.  Poderão até, quando for o caso, fazer estagio em algum país estrangeiro para verificar na prática o nível de desenvolvimento humano desses lugares. Quando julgarem mais satisfatório poderão  até pleitear um lugar nesse país.
Denise então perguntou como, qual o critério, para o conselho admitir novos membros na comunidade:  -É por algum concurso, por indicação? Como será? – Os candidatos serão indicados pelos munícipes e apreciados pelo Conselho.  Se aceitos ingressarão na escola preparatória pelo tempo necessário a sua adaptação a nova situação até receberem autorização para construir sua residência, definir sua ocupação e receberem seu cartão social e sua inscrição na comunidade.  Mas é claro que os munícipes terão todo o cuidado na indicação a fazer, pois estarão comprometendo a sua comunidade e a si próprios com uma indicação irresponsável, que não será aceita com a verificação da realidade.  A conversa fluía animada, quando o Fred surgiu com um violão, pedindo que Átila cantasse uma de suas criações musicais, no que foi atendido.  Todos escutavam atentos à letra que criticava o regime capitalista... Uma delas descrevia o conflito político pelo qual passava o Estado com as pressões da oposição pelas eleições diretas e a abertura democrática.  Queriam mais participação política, mais partidos e, principalmente, mais liberdade de expressão.               

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